O quê? Valho Mais que uma Flor
 O quê? Valho mais que uma flor 
  Porque ela não sabe que tem cor e eu sei, 
  Porque ela não sabe que tem perfume e eu sei, 
  Porque ela não tem consciência de mim e eu tenho consciência dela? 
  Mas o que tem uma coisa com a outra 
  Para que seja superior ou inferior a ela? 
  Sim tenho consciência da planta e ela não a tem de mim. 
  Mas se a forma da consciência é ter consciência, que há nisso? 
  A planta, se falasse, podia dizer-me: E o teu perfume? 
  Podia dizer-me: Tu tens consciência porque ter consciência é uma qualidade humana 
  E só não tenho uma porque sou flor senão seria homem. 
  Tenho perfume e tu não tens, porque sou flor... 
  Mas para que me comparo com uma flor, se eu sou eu 
  E a flor é a flor? 
  Ah, não comparemos coisa nenhuma, olhemos. 
  Deixemos análises, metáforas, símiles. 
  Comparar uma coisa com outra é esquecer essa coisa. 
  Nenhuma coisa lembra outra se repararmos para ela. 
  Cada coisa só lembra o que é 
  E só é o que nada mais é. 
  Separa-a de todas as outras o facto de que é ela. 
  (Tudo é nada sem outra coisa que não é).
 Alberto Caeiro, in "Poemas Inconjuntos" 
