setembro 23, 2016

Fernando Pessoa



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Retrato de Fernando Pessoa, pintado por Adolfo Rodríguez Castañé.

Fernando Pessoa (contado pelo Sr. Moitinho)
por Anabela Mota Ribeiro

Vestia-se nos melhores alfaiates de Lisboa. No entanto, metia vales à caixa ou vendia livros para pagar as despesas. A Mensagem permitiu-lhe pagar todas as dívidas.
No escritório tratavam-no por Senhor Pessoa. Ali era o seu lar. Ali escreveu, à noite, Tabacaria e parte da sua obra, na mesma máquina onde, de dia, redigia cartas e anúncios comerciais. (Por exemplo, o slogan para a Coca-cola: “Primeiro estranha-se, depois entranha-se”; mas o Director Geral de Saúde não autorizou a importação do produto).
Daquele escritório nasceram as personagens do Livro do Desassossego. A “Tabacaria do outro lado da rua” era a tabacaria que via da janela, a Havaneza dos Retrozeiros.
As tardes de trabalho eram marcadas pela ida ao Abel. Mas a verdade é que nunca ninguém o viu bêbedo.
Da sua vida íntima pouco se sabe. Pouco se sabe da sua relação com Ofélia Queiroz, o único caso amoroso que se lhe conhece.
Talvez Fernando Pessoa fosse um anjo. Um ser assexuado. Assim o define Luis Pedro Moitinho de Almeida, advogado, uma das poucas pessoas ainda vivas que privaram com o poeta. Filho de Carlos Moitinho de Almeida, o patrão de Fernando Pessoa, o Patrão Vasques do Livro do Desassossego, tornou-se seu amigo e admirador.
Em 32 Moitinho editou o livro de poemas «Acrónios», prefaciado por Pessoa e que encerra do seguinte modo: «São estas as considerações que submetto a Luiz Pedro, que m’as pediu. Submetto-as também a várias outras pessoas, que se esqueceram de m’as pedir».
Aos 91 anos, Moitinho de Almeida fala do convívio com Pessoa, do funeral deste com pouquíssima gente, dos percursos feitos até à Rua Coelho da Rocha onde o poeta habitava; mas onde, apesar da amizade entre os dois, o advogado nunca entrou.