«Quando for grande, não quero ser médico, engenheiro ou professor.
 Não quero trabalhar de manhã à noite, seja no que for.
 Quero brincar de manhã à noite, seja com o que for.
 Quando for grande, quero ser um brincador.
 Ficam, portanto, a saber: não vou para a escola aprender a ser um médico, um engenheiro ou um professor.
 Tenho mais em que pensar e muito mais que fazer.
 Tenho tanto que brincar, como brinca um brincador, muito mais o que 
sonhar, como sonha um sonhador, e também que imaginar, como imagina um 
imaginador…
 A mãe diz que não pode ser, que não é profissão de gente
 crescida. E depois acrescenta, a suspirar: “é assim a vida”. Custa 
tanto a acreditar. Pessoas que são capazes, que um dia também foram 
raparigas e rapazes, mas já não podem brincar.
 A vida é assim? Não 
para mim. Quando for grande, quero ser brincador. Brincar e crescer, 
crescer e brincar, até a morte vir bater à minha porta. Depois também, 
sardanisca verde que continua a rabiar mesmo depois de morta. Na minha 
sepultura, vão escrever: “Aqui jaz um brincador. Era um homem simples e 
dedicado, muito dado, que se levantava cedo todas as manhãs para ir 
brincar com as palavras.»  
Álvaro Magalhães, "O Brincador"



