Recebeu, pelas suas Poesias
Completas, o
Prémio da Crítica do Centro Português da Associação Internacional de Críticos
Literários (1983).
PORTUGAL
Ó Portugal, se fosses só
três sílabas,
linda vista para o
mar,
Minho verde, Algarve de
cal,
jerico rapando o espinhaço
da terra,
surdo e
miudinho,
moinho a braços com um
vento
testarudo, mas embolado e,
afinal, amigo,
se fosses só o sal, o sol, o
sul,
o ladino
pardal,
o manso boi
coloquial,
a rechinante
sardinha,
a desancada
varina,
o plumitivo ladrilhado de
lindos adjectivos,
a muda queixa
amendoada
duns olhos
pestanítidos,
se fosses só a cegarrega do
estio, dos estilos,
o ferrugento cão asmático
das praias,
o grilo engaiolado, a grila
no lábio,
o calendário na parede, o
emblema na lapela,
ó Portugal, se fosses só
três sílabas
de plástico, que era mais
barato!
Doceiras de Amarante, barristas de
Barcelos,
rendeiras de Viana, toureiros da
Golegã,
não há “papo-de-anjo” que seja o meu
derriço,
galo que cante a cores na minha
prateleira,
alvura arrendada para o meu
devaneio,
bandarilha que possa enfeitar-me o
cachaço.
Portugal: questão que eu tenho comigo
mesmo,
golpe até ao osso, fome sem
entretém,
perdigueiro marrado e sem narizes, sem
perdizes,
rocim engraxado,
feira cabisbaixa,
meu remorso,
meu remorso de todos nós . .
.
Alexandre
O’Neill