Equinócio
Chega-se a este ponto em
que se fica à espera
Em que apetece um ombro o
pano de um teatro
um passeio de noite a sós
de bicicleta
o riso que ninguém reteve
num retrato
Folheia-se num bar o
horário da Morte
Encomenda-se um gin
enquanto ela não chega
Loucura foi não ter
incendiado o bosque
Já não sei em que mês se
deu aquela cena
Chega-se a este ponto
Arrepiar caminho
Soletrar no passado a
imagem do futuro
Abrir uma janela Acender o
cachimbo
para deixar no mundo uma
herança de fumo
Rola mais um trovão
Chega-se a este ponto
em que apetece um ombro e
nos pedem um sabre
Em que a rota do Sol é a
roda do sono
Chega-se a este ponto em
que gente não sabe.
David Mourão-Ferreira
In Do tempo ao coração
1966